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segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Teologia Política - Teologia Contemporânea

Johan Baptist Metz (foto ao lado)

Teologia Política

Num período de formulações teológicas, tanto no âmbito católico, com o Concílio Vaticano II (1962 – 1965), quanto no evangélico, com a teologia de orientação histórica de W. Pannenberg (1961) e também com a formulação da Teologia da Esperança de Jürgen Moltmann (1964) ocorre um período de reviravolta política da teologia e, então, nasce a Teologia Política na Europa (1965 – 1968) e da Teologia da Libertação na América Latina (1968 – 1972).

1. O surgimento da teologia Política

Esse surgimento ocorre numa época de diálogo entre cristãos e marxistas onde o teólogo Johann Baptist Metz inclui em seus discursos o termo Teologia Política, indicando uma primeira elaboração do projeto teológico sobre o assunto. Ele inclui na obra Sobre a Teologia do mundo (1968) as relações entre a Igreja e o mundo, ou seja, identifica-se um problema na esfera social e, assim, o papel da igreja nela.

A partir do iluiminismo, houve um rompimento entre a igreja e a sociedade, entre a existência religiosa e a existência social. A religião, sendo assim privatizada, sofre críticas do marxismo por ter ótimas estruturas ideológicas sobre a práxis e determinadas relações de poder. Metz vai afirmar que a Igreja “privatizou esta mensagem em seu núcleo essencial e reduziu a práxis da fé à decisão amundana do individuo” [1] . A teologia política procura então resolver esse problema. Sendo assim, Gibellini relata que esta foi a esfera negativa da dupla tarefa. Defini-se como pars destruens que “consiste em ser um corretivo crítico diante da tendência da teologia à privatização, quer dizer, ela deve atuar no sentido de uma desprivatização” [2]. Ao mesmo tempo, também, ocorre um fator positivo, denominado de pars construens, que consiste em desenvolver as implicações públicas e sociais da mensagem cristã eliminando o problema levantado pelo iluminismo e o marxismo desenvolvendo, também em teologia, uma nova relação entre a teoria e a práxis.

Aqui, então, entra o aspecto da “reserva escatológica” visto, também, na Teologia da Esperança proposta por Moltmann. A reserva escatológica são as promessas escatológicas da teologia cristã confrontadas com o presente histórico.

A Teologia Política, portanto, tem o objetivo de tornar a palavra cristã uma palavra socialmente eficaz. Ela procura não apenas iluminar a consciência, mas também transformá-la!

Gibellini, com isso, levanta uma pergunta. Como se dá à luz desta teologia, a teologia política, a relação entre Igreja e mundo? Mundo aqui, como já dito, expressa a realidade social em processo histórico. Como resposta a esta questão nos é apresentada uma sequência de réplicas. Em primeiro o indivíduo jamais pode ser considerado material, em segundo na crítica das ideologias e por último, na mobilização daquele poder crítico do amor que está no centro da tradição cristã. Dentro desta perspectiva, Moltmann escreve um artigo denominado História existencial e história do mundo. Para uma hermenêutica política do Evangelho. E afirma: “Esta hermenêutica pode ser denominada hermenêutica política, porque encara a política como o amplo horizonte de vida do homem” [3].

Para explicar o passo dado no âmbito teológico com essa nova perspectiva hermenêutica e teológica, Moltmann faz uma rápida síntese da história da teologia em três etapas: “a) Uma primeira forma de teologia cristã juntou a tradição bíblica com a metáfora cosmológica: Deus foi apresentado como fundamento e o senhor do cosmo. b) Quando o racionalismo crítico demoliu as provas cosmológicas da existência de Deus, a teologia então deixou de ser cosmológica e passou a ser antropológica; ela acrescentou à tradição bíblica a antropologia moderna e se apresentou como iluminação teológica da existência: Deus foi apresentado como fundamento transcendente do humano ser-no-mundo. c) Com o declínio da imagem personalista do homem, toma a dianteira um novo tipo de teologia cristã: uma teologia escatológica que elabora um projeto de teologia política, em que Deus é apresentado como o Deus da esperança [4].

Entende-se Teologia Escatológica a seguinte definição: “Por escatologia se entende aqui a doutrina da esperança, a doutrina daquilo em que se pode esperar, e ao mesmo tempo a doutrina da práxis da esperança que introduz o futuro esperado em meio aos sofrimentos do presente. A ‘teologia como escatologia desejaria projetar o horizonte universal do futuro no qual a teologia dever-se-ia tornar significativa por si mesma e relevante para o mundo” [5]. É importante ressaltar dois fatores importantes. Em primeiro, que a teologia política nasce dentro de duas perspectivas.O da Teologia da Esperança e o da Teologia Existencial de Bultmann. E em segundo é que a teologia política nasce na Alemanha depois da última guerra, sobre a impressão de Auschwitz. Passa-se a impressão que após a guerra havia um pessimismo angustiante sobre a teologia.

Mas por que da Teologia Existencial de Bultmann? Essa influência se dá sob três aspectos. O método histórico-crítico, a teologia dialética e a filosofia existencial. Analisado à luz desses três elementos, a Teologia Política “torna verdadeira” a teologia existencial.

a) Histórico crítico: com a desideologização da história da tradição, da pré-compreensão e da auto-compreensão.

b) Teologia Dialética: significa que a compreensão da historicidade da homilia sobre Deus, de acordo com a qual um pronunciamento teológico não é adequado porque demonstra um conteúdo que tem valor atemporal e a-histórico, e sim porque dá uma resposta a uma situação concreta.

c) Teologia Existencial: tirada de Heidegger e formalizada. Se a preocupação da teologia existencial é com a vida autentica do indivíduo, a preocupação da teologia política é com a vida autentica para todos os homens em termos de liberdade, e, portanto, de libertação.

Gibellini mostra que a teologia política, com Metz, Moltmann e Sölle configura um novo movimento teológico interconfecional diversificado.

2. A discussão em torno do programa de “teologia política”

A teologia política teve uma recepção polêmica comparada à teologia da esperança, no final da década de 60.

A primeira objeção foi decorrente quanto ao termo “Teologia Política”, pois poderia dar lugar a equívocos. A antiguidade pagã conhecia uma teologia política e também o cristianismo constantiniano, que funcionava como uma ideologia do Estado. A resposta de Metz se dá pelo fato que depois do iluminismo, o termo político modificou-se em relação ao uso antigo devido a dois fatos. Primeiro pela distinção entre estado e sociedade e em segundo é que o discurso crítico é libertador e pretende promover a história humana da liberdade.

A segunda objeção se estabelece na relação entre identidade e relevância. A resposta se dá afirmando que a Igreja cristã não é uma seita, mas possui uma missão pública! No atual contexto histórico social nascido do iluminismo, a igreja cristã não pode ter relevância se não se confrontar com a história da liberdade. Alguns procuram refugiar-se, em vez disso, numa espécie de “ortodoxia” desligada dos problemas histórico-sociais. Com o defasamento dos conceitos da Igreja perante a sociedade, Metz procura apresentar como principal tarefa a ideologia de que a “Grande Igreja” não é uma seita.

Começa-se uma objeção, onde Erik Peterson levanta questões sobre a teologia política e a religião política. Respondendo Erik Peterson, Carl Schmitt, outro ícone da teologia política, sustenta a tese da concordância entre a estrutura social de uma época e sua imagem metafísica e teológica da realidade: “Todos os conceitos mais significativos da moderna doutrina do Estado são conceitos teológicos secularizados. Não só segundo seu desenvolvimento histórico, porque eles passaram a doutrina do Estado a partir da teologia, como por exemplo, o Deus onipotente que se tornou legislador onipotente, mas também em sua estrutura sistemática. [...] Só com a consciência dessa situação de analogia é possível compreender o desenvolvimento sofrido pelas idéias da filosofia do Estado nos últimos séculos” [6]. Era sistemático afirmando uma correspondência entre níveis de realidade. A realidade política e a religiosa. Para responder estas afirmativas foi necessário retornar a discussão aos conceitos históricos. Afirma-se que durante a história a teologia cristã funcionou como teologia política em suas posições monoteístas monarquista. Contudo, para Peterson, este conceito é infeliz, pois ele retrata que a forma do cristianismo enxergar a Deus se faz num conceito Trinitário. Em Deus há uma pluralidade não imitável ad extra. Ele afirma: “Somente o terreno do judaísmo e do paganismo pode haver algo como uma ‘teologia política’. Mas o anúncio cristão do Deus uno e trino se situa para além do judaísmo e do paganismo, pois o mistério da Trindade existe somente na própria divindade, não na criatura humana. Assim como a paz, que o cristão procura, não é garantida por nenhum imperador, mas somente um dom daquele que é ‘maior que toda razão’” [7].

Gibelinni faz a seguinte definição da Teologia Política:

“A teologia política é categoria do estoicismo grego, donde passou ao estoicismo romano. Literariamente, a expressão se encontra em Terêncio Varrão, cujo texto – que se vale por sua vez de outros textos – conhecemos por meio de Agostinho, que discorre a respeito dele no De civitate Dei” [8] .

Esta afirmativa se faz valer no texto diante do contexto cristão, que não só na Antiguidade exerceu política, mas em tempos modernos, sob uma forma de “religião civil”. É evidente que a religião, com seus simbolismos e práticas, desempenha uma função de apoio ao poder público.

Resumindo, A Teologia Política abraça diversas acepções:

a) Há uma teologia política como religião política. Referindo-se a um conceito de longa data, indo da Theologia civilis do estoicismo à civil religion americana.

Contudo, Peterson demonstra uma incompatibilidade entre a teologia política e a teologia cristã.

b) Uma teologia política de Carl Shmitt, onde se trata sobre uma “teologia política jurídica”, onde ele vê essa teologia com uma esfera da ciência jurídica.

c) Uma teologia política no sentido théologie politique de humanismo integral (1936), do filósofo francês Maritain. Onde ele aborda ideologias sobre a “teologia da política”, ou, também, a “teologia do político” numa perspectiva da teologia cristã da política e sobre a política.

d) E, finalmente, uma “nova teologia política”, onde aborda-se a idéia de que a teologia da cruz, desenvolvida também por ele, exige uma nova teologia política. A cruz incentiva e constrange os cristãos a criarem para si mesmos uma teologia política crítica.

3. As categorias da teologia política

A proposta que Gibellini apresenta é que, se a teologia política pertence ao contexto do debate das relações entre igreja e mundo, a teologia política é incluída no projeto de uma teologia fundamental prática.

Se configura, então, uma “apologia de uma esperança” segundo as exigências de 1Pe 3.15 que afirma: “estar sempre prontos a dar razão de vossa esperança e de todo aquele que vos pede”. Assim, esta se configura como uma teologia fundamental. Contudo, ela não pode abster-se em ser apenas uma teologia que apresenta fundamentos da religião sem assumir uma conotação prática. Torna-se, com isso, uma “práxis apologética”. Para Metz, as teologias, transcendental de Rahner e a teologia no horizonte da história universal de Pannenberg, assumem um confronto crítico com a problemática da Modernidade, mas não, ainda, assumem um confronto prático. “A fé dos cristãos deve tornar-se práxis na história da sociedade; a ortopráxis é o preço da ortodoxia” [9] . Para Hans Küng, a polêmica com sua interpretação da mensagem cristã em Ser cristãos, mas sim, o de possuir uma ciência prática de Jesus Cristo. Ele afirma: “A tão discutida crise de identidade do cristianismo é antes de tudo uma crise não propriamente de sua mensagem, e sim dos indivíduos e das instituições que o representam, que com demasiada facilidade se subtraem ao sentido inevitavelmente prático da própria mensagem e assim quebram a força de sua inteligibilidade” [10]. Sendo assim, a teologia política como teologia fundamental prática se articula em três categorias básicas: Memória, narração e solidariedade.

1ª Categoria: MEMÓRIA

Metz fala preponderantemente sobre o conteúdo da memória cristã, mobilizados em função prática. Trata-se de ter a fé como memória. A fé está em primeiro plano na Teologia política.

2ª Categoria: NARRAÇÃO

Entende-se que, aquilo que se tem memória, deve ser narrado! Se a teologia é em grande parte uma teologia argumentativa e hermenêutica, ela deve ser completada por uma teologia narrativa. A narração é performativa e tende a comunicar uma experiência e provocar novas experiências.

3ª Categoria: SOLIDARIEDADE

A teologia política como apologia prática da esperança cristã é a solidariedade. Caracteriza-se como “místico-político”. Místico porque nasce da fé como memória e narração da história de Jesus; e político porque é práxis na história da sociedade. Traz a idéia de “tornar-se sujeito” e por “continuar sujeito” de todo ser humano diante de Deus. A solidariedade, ainda, não apenas como solidariedade “para frente”, mas também, “para trás”, com os mortos e as vítimas.

Memória e narração se tornam prática através da solidariedade. Mas só as três juntas, memória, narração e solidariedade podem ser as categorias de uma teologia fundamental prática.

A teologia política observou o caminho traçado pela transcendência aberto pelo pensamento filosófico. Portanto, a teologia cristã encontra-se em múltiplos contextos sociais através da teologia latino-americana de libertação, teologia negra nos EUA, a teologia Minjung na Coréia, teologia feminista e muitas outras formas de teologia que demonstram a necessidade da consciência política da teologia cristã.

Por Bruno Sathler


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[1] J. B. Metz, Sulla teologia Del mundo (1968), p. 106
[2] GIBELLINI, Rosino – “Teologia do século XX”, Edições Loyola, Cap. X – “Teologia Política”, p. 301
[3] MOLTMANN, Jürgen – “Storia esistenziale e storia universale. Verso un'ermeneutica politica del vangelo”, p162.
[4] GIBELLINI, Rosino – “Teologia do século XX”, Edições Loyola, Cap. X – “Teologia Política”, p. 304 - 305
[5] Id., “Teologia come escatologia” [1968], in Religione, rivoluzione e futuro [1969], p. 187
[6] SCHMITT, Carl – “Teologia Política” – p. 61 / GIBELLINI, Rosino – “Teologia do século XX”, Edições Loyola, Cap. X – “Teologia Política”, p.311. - Carl Schmitt é considerado um dos mais significativos (porém também um dos mais controversos) especialistas em direito constitucional e internacional da Alemanha do século XX. A sua carreira foi manchada pela sua proximidade com o regime nacional-socialista. O seu pensamento era firmemente enraizado na fé católica, tendo girado em torno das questões do poder, da violência, bem como da materialização dos direitos. Além dos direitos constitucional e internacional, a sua obra abrange campos acadêmicos como a ciência política, sociologia, teologia, filologia germânica, e filosofia, entre outros. (Wikipedia)
[7] PETERSON, Erik – “ Il monoteísmo come problema politico” (1935), p.72 / GIBELLINI, Rosino – “Teologia do século XX”, Edições Loyola, Cap. X – “Teologia Política”, p. 312.
[8] GIBELLINI, Rosino – “Teologia do século XX”, Edições Loyola, Cap. X – “Teologia Política”, p. 312.
[9] GIBELLINI, Rosino – “Teologia do século XX”, Edições Loyola, Cap. X – “Teologia Política”, p. 316
[10] KÜNG, Hans – “La fede, nella storia e nellasocietà” – p.7 / GIBELLINI, Rosino – “Teologia do século XX”, Edições Loyola, Cap. X – “Teologia Política”, p. 316

quinta-feira, 22 de julho de 2010

PAUL TILLICH - O APÓSTOLO DOS INTELECTUAIS






Para muitos, Tillich foi o maior teólogo protestante do século XX. Esta avaliação aparece bastante principalmente entre os teólogos católicos. O interessante é que Tillich só foi ganhar destaque no mundo teológico depois de sua chegada nos EUA, e nesta época ela já tinha quase 50 anos! Ele buscou criar uma teologia que ficasse no meio termo entre o liberalismo e a teologia dialética de Barth e Brunner. Ele nasceu na Alemanha, e era filho de um pastor luterano, seu pai mudou várias vezes de lugar, o que permitiu que Tillich tomasse contato com vários lugares da Alemanha.[1] Há quem considere Tillich como um teólogo "neo-liberal", pois ao mesmo tempo que teceu críticas ao liberalismo do Século XIX, ele também preserva muito da teologia liberal do Século XIX. Em razão da sofisticação do seu pensamento e sua preocupação em tornar o cristianismo aceitável para o meio acadêmico, também pode ser chamado de "apóstolo dos intelectuais", uma espécie de Justino Martir do século XX. A sua influência foi tão grande como a de Barth, e existem em todo mundo, inclusive no Brasil, grupos de estudos direcionados para pesquisa de sua teologia.[2]



O interesse de Tillich por Filosofia e Teologia nasceu desde a infância, pelo menos desde os 8 anos.[3] Em 1900, juntamente com sua família, Tillich chega a Berlim, a capital alemã. Tillich sempre se dedicará a seus estudos, e terá formação filosófica em Tubingen, e teológica na pietista Halle. Tanto em seus estudos filosóficos como teológicos, ele receberá uma grande influência do filósofo Schelling, e a partir desta influência, ele buscar criar uma filosofia cristã. Em seus estudos de teologia recebe também uma forte influência do teólogo católico Martin Kahler (1835-1912) que ensinava que temos nos evangelhos o Cristo da fé, e não mais o Cristo histórico.[4]



Já formado, Tillich trabalha inicialmente como conselheiro pastoral no período de 1912 até o início da primeira guerra. E será quando trabalhará como capelão na primeira guerra, que ele experimentará uma guinada em sua vida espiritual e teológica. A guerra o levou a ter contato com os pobres e miseráveis, o que o impressionou bastante, e também o levou a uma grande decepção com o Estado que ele tanto admirava. Tillich descreve que em 1915 durante a batalha de Champagne, ele andava entre mortos e moribundo, aquilo o tocou profundamente, e sentiu que a filosofia idealista e os princípios da burguesia alemã não davam as respostas suficientes para as angústias humanas. Tillich chegou a ter que enterrar com as suas próprias mãos muitos soldados, e em razão desta experiência chegou a duvidar da fé e ter dois colapsos nervosos. Para Tillich, a partir daquele momento, o "conceito tradicional de Deus estava morto", era preciso buscar um novo conceito mais contemporâneo para definir Deus. O Deus do liberalismo e do teísmo não eram mais suficientes.[5]



Voltando a Alemanha, Tillich assiste um país em convulsão social, com muita pobreza e greves por todo lado. Então ele buscar fundar um movimento conhecido como socialismo religioso, que tenta demonstrar que a sociedade precisa de fundamento religioso, ou se não, experimentaremos o caos total. É neste período que surge conceitos que marcarão o pensamento de Tillich, e que trataremos no decorrer deste capítulo, conceitos como: correlação, princípio protestante, sola lides da fé, kairós entre outros. Em 1925 ele começa a trabalhar na sua Teologia Sistemática, inicialmente influenciado pela teologia dialética de Barth, posteriormente porém, Tillich irá discordar bastante do pensamento de Barth.[6]



A brilhante carreira de Tillich como professor universitário começou em 1919. Na Alemanha ele irá lecionar em Berlim, Marburg, Dresden, Leipzig e Frankfurt. A sua carreira universitária sofrerá um duro golpe quando ele se posiciona contra o então nascente nazismo. Tillich será o primeiro professor universitário não judeu a ser afastado de sua cátedra. Em 1933, Reinhold Neibuhr está na Alemanha, e convida Tillich para ir para os Estados Unidos, e fugir da perseguição nazista. Chegando aos Estados Unidos, começa o seu período mais produtivo. Chegando aos EUA, Tillich irá lecionar no Union Theological Seminary de Nova Yorque. Ele elogiará bastante o ambiente acadêmico do Seminário, principalmente por ser frequentado por pessoas de vários países. Neste período ele também descobre a psicologia, que irá também influencia seu pensar teológico. Tillich busca usar arte, cultura, política, ação social para fazer teologia. No fundo o seu grande objetivo é tornar a mensagem cristã aceitável para o ambiente acadêmico em que ele vive. Com o passar dos anos cresce o número de pessoas que se matriculam em seus cursos, e também os seus seguidores. Em 1955 ele consegue lecionar em Harward, nas mais cobiçada cátedra de teologia dos EUA.[7]



Entre 1919 e 1933, ou seja, do início de sua carreira como professor universitário até a mudança para os EUA, Tillich trabalhou bastante com questões sociais e políticas, sendo um dos fundadores de um movimento chamado de “Socialismo Religioso”, o que poderia ser definido como uma síntese de socialismo e religião. O seu escrito mais marcante foi a “Decisão Socialista” que foi aprendido pela Gestapo e queimado em praça pública. Tillich sempre irá discutir questões políticas e sociais, porém não com tanta ênfase como neste período.[8]



A produção literária de Tillich é vastíssima, são cerca de 400 obras! O seu período americano foi o mais produtivo e influente. Entre as suas importantes obras podemos destacar: A Era Protestante (1948); O Abalo das Estruturas (1948); Coragem de Ser (1952); Amor, Poder e Justiça (1954); Novo Ser (1955); e claro, a sua monumental Teologia Sistemática lançada em três volumes nos anos de 1951, 1957 e 1963. Após a sua morte ainda foram lançadas mais duas obras importantes: Perspectivas da Teologia Protestante dos Séculos XIX e XX (1967) e História do Pensamento Cristão (1968), na verdade estas obras são transcrições de suas aulas ministradas em Nova York sobre os referidos temas.[9]



Em 1936, ocasião dos seus cinquenta anos, Tillich escreveu uma autobiografia chamada “Na Fronteira”, onde ele aborda as vantagens de ter tido uma carreira teológica na Alemanha e depois nos EUA. Ele dizia que era ótimo estar na fronteira entre a terra natal e a terra estrangeira, com isso a visão do mundo crescia e se aprofundava. Assim não ficava-se preso a preconceitos ou provincianismos. Para Tillich “a fronteira é o melhor lugar para adquirir conhecimento”.[10]



A influência de Tillich no meio acadêmico americano foi enorme. Em 1940 ele já recebia o título de cidadão americano, logo em seguida receberia o título de doutor honoris causa na Universidade de Yale. Nesta época diziam que ele era "um filósofo entre os teólogos e um teólogo entre os filósofos". Em Harward ele recebeu o direito de livre docência, com isso ele podia lecionar a matéria que quisesse e quando quisesse, tendo bastante tempo disponível para pesquisar e escrever. Em todo este período nasceu uma verdadeiro culto a figura de Tillich, com alunos esperando horas para assistir suas conferências, mas havia quem dissesse que estas palestras não passavam de "balela ininteligível". Em 1961 ele assistira de camarote, graças a um convite especial, a posse do presidente Kennedy. Sem dúvidas Tillich foi uma lenda no seu próprio tempo, mas sua biografia também traz muitas polêmicas e ambiguidades: o medo da morte sempre o perseguiu, apesar de sua fé cristã; era também conhecido por sua vida boêmia, o que levou ao fim o seu primeiro casamento; foi um defensor do socialismo, mas nunca abriu mão dos benefício de fazer parte de uma classe média alta; o seu pouco interesse por estar presente em atividades de sua igreja, na verdade ele raramente ia a igreja.[11]



Os postulados da teologia de Tillich

Olson & Grentz resumem da seguinte forma os principais postulados da teologia tillichiana[12]:



1) A teologia deve ser apologética, falar a atual situação cultural, e não ser simplesmente atirada como uma pedra sobre a cabeça das pessoas como fazem os fundamentalistas e mesmo o neo-ortodoxos como Barth;



2) Há um denominador comum entre Deus e os homens, pois se assim não fosse, toda teologia seria obsoleta, e este denominador comum pode ser observado nas manifestações da cultura humana;



3) A filosofia tem papel essencial no pensamento teológico, pois como dizia Tillich "Nenhum teólogo deve ser levado a sério como teólogo, mesmo que seja um grande cristão e um grande estudioso, se sua obra mostrar que ele não leva a sério a filosofia". Tillich só destaca que a Filosofia trata as questões de forma um tanto quanto fria e objetiva, já a teologia busca a verdade com paixão, temor e amor;



4) O melhor sistema filosófico para ser usado pela teologia deve ser a ontologia existencialista, pois a ontologia busca estudar o ser, e o existencialismo trabalha com as angústias humanas. Expressões da ontologia são usadas em abundância por Tillich. Ele fala de Deus como o "ser-em-si", fala também que o "não-ser" é a ansiedade que acompanha todo ser finito, e que o homem busca resposta para a possibilidade do "não-ser", e isso leva o homem ao poder-de-ser que é Deus.



5) A natureza especial e complexa da existência humana. Tillich gostava de ser referir ao ser humano como um "microcosmo"

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[1] MONDIN, Batista. Os Grandes Teólogos do Século Vinte. p. 87

[2] GRENTZ, Stanley & OLSON, Roger. A Teologia do Século 20. p. 135-36

[3] Ibid.. p. 137

[4] MONDIN, Batista. Os Grandes Teólogos do Século Vinte. p. 88

[5] Ibid. p. 89; GRENTZ, Stanley & OLSON, Roger. A Teologia do Século 20. p. 137

[6] MONDIN, Batista. Os Grandes Teólogos do Século Vinte. p. 90

[7] Ibid. p. 91-92

[8] GIBELLINI, Rosino. Teologia do Século XX. p. 84

[9] MONDIN, Batista. op. cit. p. 92-95

[10] GIBELLINI, Rosino. Teologia do Século XX. p. 85

[11] GRENTZ, Stanley & OLSON, Roger. A Teologia do Século 20. p. 138-39

[12] Ibid. p. 139-41

sábado, 17 de julho de 2010

Teologia e Cultura - A Ortopraxia!

Ian Hamilton, ministro na Londoun Church em Newmilns, Escócia, foi um dos palestrantes do 6º Simpósio sobre “Os Puritanos” (06/1997), e lá afirmou: “Tradição reformada é corporativa”! Ele trata sobre esse “corporativismo” quando cita Calvino, onde afirma-se que devemos lidar de forma mais saudável com as diferenças no culto reformado. Importante ressaltar que o culto reformado expressa seu pensamento teológico obtido e defendido de forma prática. Pelo menos, é o que deveria ser!
Sendo assim, foi segundo a tradição reformada e pregada por Calvino, em sua obra, “As Institutas” (livro 1), que entendemos que toda arte é tida por expressão de adoração a Deus. Isso é o que relata as Escrituras, o cerne do pensamento reformado, em Gênesis 1. 26: “Também disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança...”.
A arte é a demonstração daquilo que Deus concede ao homem na criação. Trata-se do poder criativo concedido à humanidade. É o que conhecemos como sendo os Atributos Comunicáveis de Deus. A criatividade expressada em artes. E a arte é sempre uma das características que ressaltam nos moldes culturais. Seja na dança, nas festas, em quadros, nas artes plásticas, sempre que observamos uma arte criamos uma ligação à cultura. A cultura, portanto, é o resultado da Graça de Deus. Ainda que sendo parte de uma Graça comum, trata-se de um favor imerecido. Graça porque Deus permite que todos possam nascer com um senso divino dentro de si. Cada criatura exercendo objetivos primários de Sua criação. Cada cultura ressaltando o próprio Deus e Deus fazendo parte da história do homem em sua formação cultural. Contudo, essa característica cultural foi distorcida pelo pecado. Mas, mesmo assim, existente uma comunicação! A realidade de que Deus está envolvido com o ser criado é algo observado de forma real e presente. É a Sua Imanência refletindo seu imenso amor.
Sendo assim, “Tradição reformada é corporativa”! Cada cultura pode e deve desenvolver um método litúrgico expressando a realidade do ser criado. Com reflexão, reverência e objetivo. Deus seja glorificado com o que nos foi concedido por Ele mesmo! Bruno Sathler